FANTASIA

 

 

A LUA NÃO VEIO

Hoje ela não veio com seu veneno
branco-prateado, feito leite celeste,
a secura no luar líquido da noite...
Não veio ela nem meu moreno.

Esta noite será de minha lira,
será de meu verso-açoite
atiçando a brancura selene...
Mesmo que esteja ela fora de mira.

Hoje meu pranto não veio...
Secou, no breu da noite.
Na língua, sabor de fel.

Esta noite, meu anseio
Talhou o próprio açoite
E desmereceu o céu.

Anorkinda

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A morrer de frio

De qualquer cor
tamanho ou feitio
empreste-me, amor
um casaco qualquer...

é pra esquentar-me
deste tremendo frio
bem ligeiro, abriga-me
com o casaco do general...

apenas aqueça-me
ou, amor, esqueça-me...
pois neste alto inverno

quem sente o tremor
dos ossos, um horror...
entrega-se ao sono eterno

Anorkinda

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Apaixonante lua

Tudo se deu quando
ela percebeu
o reflexo da lua
no imenso mar

Apaixonada e tanto
ela enlouqueceu:
mergulho fundo
ou voo ao céu?

Sentiu-se mais perto
do firmamento
estrelas companhias

Decidiu alçar voo
jogou seu espirito
ao céu, a casca no mar

Anorkinda

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Cérebro, casa de esquilos!

Tico e Teco, meus neuroninhos sensíveis,
atabalhoados, muitas vezes, incríveis
fórmulas decifram, com gosto e afinco.
Mas se eu exagero e com eles brinco

querendo misturar as receitas da razão,
eles protestam, fazem greve, confusão!
Esquilos espertos, amam a tranquilidade
e satisfazem-se com as nozes da verdade.

Me auxiliam quando crio, em arte.
Me divertem na sacada inteligente
que eles me oferecem, às vezes.

Ah... meu cérebro que em parte
é morada de esquilos e de repente
também é plantel de muitas vozes!

Anorkinda

 

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Em casa vazia

Entrei em uma casa vazia
Senti os arrepios das sombras
Toques frios em mãos macias
Entrei no Reino das Brumas

Tremi ao frio de um dia
Andei pelos quartos soturnos
Densos fluidos das manias
Tremi ante os velhos tronos

Névoas de toda solidão
que se vive na escuridão
Adentraram em mim

Saudades de muitas eras
vividas em toque de esperas
Anunciaram mais um fim

Anorkinda

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Eu amo o amor

Todo Ser é uma emanação de amor
e eu amo cada centelha que brilha
através do olhar, brilha no sorriso
cintila nos braços que abraçam

Sempre que minha alma sente
a outra, eu amo em demasia
às vezes assusto, tempero
demais e os laços ameaçam

Todo amor é infinitude
em tempo e tamanho
é beatitude e louvor

Sempre minh'alma
vibra ao encontro
do corpo com a luz

Anorkinda

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FUXIQUEIRA

Colorida fuxiqueira,
vem sambando quando quer.
Mas, às vezes, ela não requebra
e, de quebra, desafia o artesanato.

Ela quer mais cor no mundo,
não se conforma com ponto torto.
Por isso desmonta qualquer artifício
e do ofício, costureira, faz consagração.

Divertida fuxiqueira,
vem cantando sua paixão
pelas flores e estampados.

Ela quer oferecer ao mundo
seu charme e inocente teoria
de costurar amor por todo lado.

Anorkinda

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Minguante

Depois da trajetória lua
pelos dias, rotatória
Depois de exibir-se cheia
num longo expandir-se

Observo seu movimento revés
maior é meu deslumbramento
Observo sua silhueta reduzir
cumprindo com a etiqueta

De esconder-se acanhadamente
após tamanha exposição
Estabeleço uma comparação:

Se depois de meu deleite mágico
precisarei em submissão
minguar-me de insatisfação?

Anorkinda

 

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Moça em lua grande

Somente em noite de lua grande
quando as águas do lago negro
prateiam em rebrilho diamante
é que a moça pode ser vista

Ela caminha calma e lânguida
em direção à densa floresta
pranteia um imenso desamor
escuridão é o que lhe resta

O encanto traz má sorte
quem a vê, assim triste
suspira junto à morte

O bom é imitar a bruma
evitar a visão sinistra
e desconhecer-lhe a pista

Anorkinda

 

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Mosaico de sons

Acordes se ouvem
a cada ponto traçado
nos dedos dela
a arte do bordado

Mágica e cor
pontuam estrelas
essência de amor

Graciosidade em tons
a cada nota vertida
nos lábios dela
a canção da vida

Fôlego e inspiração
manuseiam entrelinhas
sutilezas da paixão

Anorkinda

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 O Passeio da Morte


Ouvia-se histórias sobre o casarão
Dizia-se que em noite de lua cheia
O falecido voltava a vagar por ali
Na companhia, claro, do gato preto

Dizia-se que o reflexo de uma lua
duplicada, avisava do fenômeno
e quem temia, dormia mais cedo
nem noite de bruxa era tão sombria

Seu Tomé era o zelador do casarão
Ouvia-se que ele iluminava o passeio
do falecido pelo jardim, entristecido
com saudades do calor da vida

As estrelas também sentiam pena
e caíam sobre a noite, consolando
aquele que jamais se conformara
com a gélida roupagem da morte

Anorkinda

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O SORRISO DE CARNAVAL

Coloridos dias
cheios de alegria
era dos feriados
o mais esperado

Luzes e fantasias
desfilavam em pleno dia
nada mais era pecado
aos personagens abraçados

Em sorrisos relaxados
dançavam inusitados
em Carnaval e folia

Pelas energias sadias
espalha-se a fantasia
de ter o sonho realizado

Anorkinda

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O Trem vai pra Pasárgada

Lá somos todos amigos do rei
ele faz versos, me banquetearei
Nosso trem vai pra Pasárgada
Nossa poesia em nova morada

Lá seremos bem tratados
os garçons serão alforriados
Nosso trem vai pra Pasárgada
Nossa amizade em florada

Na primavera chegaremos
todos de mãos dadas
à felicidade, brindaremos

Em boa saúde, a poetisa
falará com as fadas
seremos abençoados com a brisa

Anorkinda

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PRIMAVERA EM PASÁRGADA

No florido tapete já se vislumbrava
a alegria bulhosa da primavera
Doce perfume no ar também indicava
o prazer da estação em aquarela

Chegamos ditosos nestas terras
onde o Rei é um grande amigo
E a paisagem entre rios e serras
oferece á alma um forte abrigo

Que enlevo e emoção!
A poesia até dançava
airosamente no salão

Que paz no coração!
O sossego reinava
disperso em profusão

Anorkinda

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Roubo

Furtaram-me aquelas cores
que eu nunca vi rebrilhar
Furtaram-me doces sabores
que jamais atiçaram meu paladar

Roubaram-me as estrelas
de um céu sempre escuro
Roubaram-me, por tê-las
a piscar brejeiras na imaginação

O ato do roubo
deu-se silente
notei-me em arroubo

Quando, do furto
ganiu de repente
um bramido de susto

Anorkinda

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Sabor das nuvens

Delicados temperos há no céu estrelado
Leves açúcares de frutas, brancuras
Bálsamos verdes de folhas aladas
Com gostinho agridoce hortelã

Sabores faceiros de festa enluarada
Sutis perfumes de flores, salada
Tenras e salgadas iguarias salpicadas
Com recheio picante pimenta

As sobremesas mais finas
Ambrosias douradas
E tortas cabelo de anjos

Enfeitam os olhos divinos
Apetecem paladares
Eterno banquete das nuvens

Anorkinda

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Seu norte

Ele vinha com o coração à mostra
Não importava-se com tempo feio
nem mesmo caras feias ou feridas
Ele vinha sempre de peito aberto

Ele tinha um amor verdadeiro
Não importava-se com os raios
nem mesmo trovoadas ou apagões
Ele tinha muito a se oferecer

Não convinha derramar-se
tal qual chuva forte
ao sabor da má sorte

Ele detinha o poder maior
do que qualquer morte
Ele era seu próprio norte

Anorkinda

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Toda castidade à luz do candeeiro

Tua tenra castidade à prova
Nesta penumbra de alcova
Reveste-se a santidade
Com a frágil sobriedade

Num instante, num sussurro
Quebra-se sem esmurro
O poder das censuras
E teu corpo sem armaduras

Cai, liquefeito em meu leito
à luz do candeeiro
Sombras revelam-te por inteiro

Resplandece o efeito
de toda castidade
Jogada à chama da sexualidade

Anorkinda

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Viagem de volta ao surreal

Desenho um cenário bem diferente do real
Entro nele, devaneando em pincel surreal
Bosques e montanhas me receberam
Com uma estrondosa festa

Percebo a paisagem tão familiar
Subo degraus, de par em par
Amigos me cantaram
Uma linda seresta

Gracejo com todos daqui
fingindo ser normal
gargalhar no surreal

Almejo ficar por aqui
versando o anormal
poetar do mundo real!

Anorkinda